Meu pai já me dizia desde bem cedo, desafiando-me a fazer proezas "És um homem ou um rato?".
Quem nunca invejou?
Quem nunca traiu?
Quem nunca mentiu e enganou?
Quem nunca desejou o que não devia?
Quem nunca possuiu o que não queria por pura hipocrisia?
Quem admitiria tais coisas senão os ratos?
Quem tomaria posse de forma nua e crua de tais fatos?
Quem confessaria, mesmo que a si mesmo, a realIDADE de seus intentos?
Quem confessaria, mesmo que por uma piada ubuesca o que se passa em seus próprios pensamentos?
quem foi mais apreciado pelos homens
quem foi mais amado pelos amantes
quem foi mais cuidado pelos pais
quem foi mais afortunado pelo acaso
quem foi mais feliz pelas escolhas
e confesso
sou invejoso, ciumento e inadaptado
sou hora homem, hora menos que isso
mas mais do que nada, acima de tudo
Rato.
[PH]elipe Ribeiro Veiga
Que confessasse não um pecado, mas uma infâmia;
Que contasse, não uma violência, mas uma cobardia!
Não, são todos o Ideal, se os oiço e me falam.
Quem há neste largo mundo que me confesse que uma vez foi vil?
Ó príncipes, meus irmãos,
Arre, estou farto de semideuses!
Onde é que há gente no mundo?
Poema em Linha Reta - Fernando Pessoa
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Me deixem amolar e esmurrarA faca cega, cega da paixão
E dar tiros a esmo e ferir
O mesmo cego coração