sexta-feira, 12 de julho de 2013

Sobre uma observadora na cidade.





Ela, sentada no meio fio assistindo a cidade, espetacular. 
Um homem sorria para o celular, engrav-atado. Uma mulher ria e falava alto no celular de algo que acontecera na noite anterior. Um outro homem fuxicava a lixeira. O jornaleiro posicionava suas revistas. A cidade acordava e as pessoas escorriam das camas e desaguavam nos escritórios e estabelecimentos comerciais onde ficariam empossadas até o sol se ausentar e tudo ser mais do que tarde. Ela assistia as pessoas todas fazendo aquele desgaste das horas diariamente, tragava o cigarro enquanto as pessoas tragavam os dias na mesma velocidade, sem ver quanta fumaça sufocante gerava aquele fumo dos meses e anos, inutilmente desgastados, que era mais mortal que qualquer câncer. Lembrava-se que uma mulher uma vez lhe pagando um almoço lhe fez um sermão sobre futuro, aquela moça fazia uma felação do dia de amanhã. Achava que sabia o mapa do tesouro, os caminhos das tranquilidades todas. Ela tragava o cigarro e lembrava da moça e do sermão, e de como aquela benfeitora tocava nas partes íntimas do futuro achando que assim poderia excitá-lo a atender seus desejos voluptiosos de realização, segurança e riquezas. O que essas pessoas não entendiam é que para ela, há muito tempo, o momento era a Vida inteira, e o minuto seguinte ao momento presente era escravidão. Ela tragava mais um cigarro e assistia os ciclos do centro da cidade, ele enchia, as pessoas eram absorvidas pelos prédios, e vomitadas para as ruas por volta do meio-dia, e depois absorvidas novamente, e cuspidas ao fim do dia meio embagaçadas para escorrerem até suas camas, movimentando a Grande Roda, porque alguém os convenceu de que só assim a Terra continuaria a girar. 
Começava a anoitecer, e depois de assistir num expediente vital todas essas coisas e muitas outras, entre alguns muitos cigarros, ela levantava e seguia em direção ao aterro para ver o mar... "espetácu-luar".

Phelipe Ribeiro Veiga
13 de julho de 2013 - 01:26

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