sexta-feira, 20 de dezembro de 2013

Sobre Casa.

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Emirjo da minha sentimentalidade irrevogável, e pinga, salpicada, escorre fria a mágoa que carrego não de pessoas, mas da própria Vida, que me fez impossível. Há em todos um toque único, e um único tipo de toque em todo mundo, e nenhum deles é a Casa a qual sonhei por toda a minha longa juventude repousar. Admito, iludi-me, dia após dia iludi-me de que qualquer sombra no horizonte escondia em si uma abóbada de um lugar qualquer, e os dias foram passando, e minha esperança impassível via em folhas de favela possíveis telhados que me protegessem, via na sombra das árvores algum favor de preservação, quando elas só faziam sombra por não poderem arredar de cá para lá (porque se pudessem, talvez me negassem vez ou outra). Não sou um injustiçado, a Vida é uniforme em sua tratativa com meus iguais e com os meus diferentes. O que me magoa é a essencialidade do que sinto. Aglutinada a mim, essa minha necessidade de Casa extrapola, explode, se rompe, arrebenta, e vai assim se desdobrando em mil tipos de movimentos onde todos a seu modo só fazem doer. A solidão é impreterível, sou em primeira pessoa do singular, conjugado nesse tempo, no infinito. Preciso recolher-me, fecundar meus próprios pensamentos com esses sentimentos dolorosamente ferteis. Quem sabe assim, fetal dentro de mim mesmo não haja paz? Quem sabe em mim, onde encontro deserto e floresta, não haja também meu lar? 

Phelipe Ribeiro Veiga
20 de Dezembro de 2013 - 12:02



"O que eu sou hoje é terem vendido a casa, 
É terem morrido todos, 
É estar eu sobrevivente a mim mesmo como um fósforo frio..." Fernando Pessoa 


segunda-feira, 2 de dezembro de 2013

...fragmento...





... e então por vezes eu até acredito nisso. Mas daí eu saio pelo Centro da cidade pela hora do almoço e contemplo toda aquela gente engravatada, todos na beca em suas poses de homens e mulheres de negócios e fico imaginando: Com quem acordaram hoje? De quem sentem saudades vez ou outra? Quem eles perderam? Contra quem eles pecaram? E concluo que é humano ser frágil. Fico imaginando aquela secretaria carrancuda e mal amada, quem faz o coração dela disparar? Aquele chefe assexuado e enfadonho, quem o faz suspirar? Aquela mulher bem casada e dedicada, quem desvia os olhos dela? Aquele piadista da galera, qual o nome que ele pensa sempre antes de dormir e que rouba sua alegria? E então, acaso até a presidente um dia não recebeu flores? Quem de nós nunca acariciou um rosto com o cuidado de quem afaga a chama da uma vela pra não se queimar? Quem de nós nunca cortejou com olhares sufocados uma silhueta qualquer? E concluo coisa nenhuma. A Vida de novo é inconclusiva...


Phelipe Ribeiro Veiga
02 de Dezembro de 2013 - 23:11


"Porque afinal cada começo
é só continuação
e o livro dos eventos
está sempre aberto no meio."
Wislawa Szymborska

(...)

Eu vi uma casa se despir. Era uma despedida. Se despia dos quadros das paredes e exibia as marcas do tempo como um corpo que, após usar por ...