sábado, 22 de março de 2014

Sobre a erva-passarinho.



Minha existência é um encherto na árvore dos dias. Sou feito a erva-passarinho. Trazido por asas despretensiosas eu me apoio no que por aí existe, absorvo luz, me espalho e daí pego carona nas asas alheias e voo de novo. Não há raiz que me explique, nome científico que me contenha, não há fruto que a mim se determine, desobedeço as estações, e não me importo que me confundam com uma praga qualquer. Sou planta em movimento sem necessidade de vento. Sou o que sou, e a minha caminhada consiste em me assumir tal como vim, erva-viajante de estados de ser, sem compromissos alheios, senão com o que me faz fértil e vivo. A minha Vida está aí pra ser v(í)vida propositalmente. Há!

Phelipe Ribeiro Veiga
22 de março de 2014 - 15:57


sexta-feira, 7 de março de 2014

Sobre o amor, coisa quieta...



Às vezes é preciso deixar o amor coisa quieta, sem cutuca-lo, sem chacoalha-lo, deixa-lo lá, imóvel, sem conferir se está vivo. Às vezes é essencial ao amor um descanso, e até um descaso, mesmo quanto aos seus batimentos (taqui)cardíacos. Deixa dormindo, refletindo, re-sentindo. Deixe-o que se for, foi, e terá ido, e se ficar, farar-se-á mais a si mesmo, o amor confortável é sempre mais amável. E não se deve, nessas vezes, temer algum rancor (o ronco do amor), quem sabe um ressentimento ou dois. Porque não há opostos no mundo, senão compreensões. Desamar e Amar, chorar e sorrir, pensar e sentir, estar junto ou sozinho. Feito a perna esquerda e a direita, sem esses revezamentos, na Vida, não chegaríamos a lugar algum.

 

Phelipe Ribeiro Veiga

07 de Março de 2014 – 15:51

quinta-feira, 6 de março de 2014

Sobre o Acaso.



Por vezes o Acaso se cansa, e se debruça na janela dos acontecimentos e assiste a tudo, e aí nada acontece. Nessas horas a brisa desvia dos cabelos, a coceira evita o meio das costas, o cisco desvia dos olhos e a pedra evita o sapato. Nessas horas os ponteiros demoram tanto a andar que pesam no nariz dos relógios de todos os lugares fazendo rugas no rosto do tempo, e tudo isso porque o Acaso preguiçosamente assiste pela janela dos fatos a tudo e não tem vontade de nada. O rio espelhado faz pecar a paisagem por um excesso de céu, e tudo padece de modo chato e tedioso. O Acaso suspira, e por causa de sua preguiça os amores vão criando teias e os amantes ainda a se conhecerem resolvem ficar em casa e ver televisão, as nuvens retém as chuvas, as folhas pendem desanimadas nos galhos de todas as árvores. Mas o Acaso não liga. O Acaso, que é o ocaso de tudo, guarda mesquinho para si todas as possíveis novidades do mundo, e tudo envelhece feiamente imutável. Isso porque nessas horas o Acaso só suspira, vagueia silencioso em pensamentos e planos, e preguiçosamente não quer fazer nada...



Phelipe Ribeiro Veiga

06 de Março de 2014 – 15:43


(...)

Eu vi uma casa se despir. Era uma despedida. Se despia dos quadros das paredes e exibia as marcas do tempo como um corpo que, após usar por ...