sexta-feira, 16 de março de 2012

Sobre o fim do verão.



O verão já velho, prepara-se para retornar ao nosso baú de sonhos vãos, coisa típica de brasileiro que somos, passamos o ano lamentando as estações outras e ansiando por campos escaldantes cheios de corpos dourados,  mar e céu limpos e carnaval sem cinza em quarta feira. E eis que agora vem o outono. Estação de colheita dos frutos. 
E eu? Eu me atormento, confesso! Me esgotei nessa estação! Eu fui de um tudo, desde amante e amado a abandonado e traído, fui razão de suspiros de prazer e de enfado, fui o esforço da aproximação e do distanciamento. Nesta estação plantei tanta exaustão e me desidratei tanto debaixo do sol forte dos meus devaneios que já não tenho força alguma pra colher os frutos do meu outono. Cansaço. 
Há em mim um desespero por palavras, que até elas eu gastei todas, e agora o que me resta é me debruçar sobre uma página branca e vazia pra declarar o próprio vazio que sou incapaz de preencher, tanto na folha quanto em mim mesmo. A sequencia de minhas perguntas é a ausência de respostas, a dos meus atos, ausência de justificativas, de minhas tentativas, ausência de sucessos, de minhas palavras, ausência de ouvintes, de meus braços, ausência de um abraço. Meu verão vem tendo seu desfecho como uma maciça ausência de tudo, e de mim mesmo. O calor parece ter derretido minhas virtudes todas, minhas esperanças, meus sonhos, o que sobra agora é a sustentação, o esqueleto do meu intelecto, que é a certeza da morte e do fim e a compreensão e a caridade minha para com minha própria irremediável solidão. 
A estação jaz no fim e eu me sinto seguindo junto este destino, me sinto poente feito o sol desse verão insólito e cheio de desnecessidades e desassossegos vãos. O verão vai indo, e as chuvas já começam pra lavar as frutas que nós iremos colher. A chuva vai levando toda a sujeira dessa estação de intensidades muitas e profundidade nenhuma. E eu debaixo dessa mesma chuva começo a renascer, feito uma nova estação, em dias serei diferente. E enquanto a chuva segue erodindo os restos do verão, eu só espero que essas águas de março possam me trazer um pouco mais do que pau, pedra ou mesmo o fim do caminho. Que me tragam frutos de mudanças, e acima de qualquer coisa, de esperança. 

Phelipe Ribeiro Veiga
17 de Março de 2012 - 00:29


"São as águas de março fechando o Verão, é a promessa de vida no meu coração." -Tom Jobim 




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E aproveito para registrar minha homenagem a uma das maiores vozes da música brasileira, hoje a eterna voz de Elis Regina, a Pimentinha de Vinícius, completa 67 anos. Obrigado por existir e persistir!

"Gostaria que fosse diferente. Mas também, como a maioria das pessoas, estou esperando o guarda acionar a mudança de cor no sinal. Enquanto isso, eu canto um sinal de alerta." - Elis Regina

Um comentário:

Anônimo disse...

Belo texto Phelipe.
"Devemos aceitar a decepção finita, mas nunca perder a esperança infinita."
Martin Luther King


Lucas

(...)

Eu vi uma casa se despir. Era uma despedida. Se despia dos quadros das paredes e exibia as marcas do tempo como um corpo que, após usar por ...