terça-feira, 8 de agosto de 2023

Sobre a queda da Babilônia.

 


De longe, depois de um longo silêncio, houve o estalo. 


(...)


Lascou feito um grito rochoso desesperado, e, depois de um breve silêncio pontilhado por pequenas pedrinhas rolando, começou a desmoronar em som crescente.

de estalo à ruído, 

de ruído à estrondo

de estrondo ao som do fim de um mundo. 

Era no meu peito a tragédia, porém se expandia por todo meu corpo. Ecoava pelos meus braços e pelas minhas mãos trêmulas sacudindo até as pontas dos meus dedos. Minhas pernas contraíram-se de modo a sustentar o que restava de pé, e o fez, suportando o peso inteiro do desastre.

Os enormes pedaços caíram nos mares que ilhavam o monumento criando gigantescas ondas nos meus olhos salgados e esverdeados que engoliram tudo. Afogaram meus olhos de tal modo que o mundo ao meu redor ainda jaz submarino. 

O tremor do desmoronamento se pôde sentir até pelos pensamentos mais simplórios que, desatentos cruzando minhas pontes sinápticas, caíram vários para um esquecimento de nunca mais. Conexões se romperam e áreas inteiras foram feitas estéreis e isoladas das minhas intensas e coloridas tempestades neuronais. Uma densa nuvem de poeira subiu pescoço acima, passando pela garganta, escalando pelo tronco encefálico e cobrindo tudo, inclusive as memórias. Ali a visibilidade ainda é nenhuma. O estrago, desconhecido.

Pelo romper das barragens que o desmoronamento do peito causou, a boca foi drenada, ficando apenas um gosto amargo do lodo deixado pelas palavras que, feito peixes afogados no seco, saltavam naqueles espasmos característicos de quem já não vive mas ainda não morre. 

Meus ouvidos, sempre atentos ao exterior, ensurdeceram-se pelo ressoar intenso que recorria cada pedaço do meu interior. Estava ensurdecido pro mundo pelo som que ecoava vindo de dentro de mim. 

Meus poros vazaram pó e vapor quente. Feito uma chaleira, gritavam. Clamavam e avisavam: Caiu! Caiu! 

Meu peito desmoronou. Minha alma, tectônica, moveu-se e deslocou meu norte de um modo que ainda não o encontro. Minha dor entrou em erupção. Meu corpo ainda treme inteiro sem saber quais estruturas foram comprometidas e o que mais ainda está por cair.
 
Enquanto isso, meus poros seguem gritando: 

"Caiu! Caiu!"

08 de agosto de 2023 - 14h19
Phelipe Ribeiro Veiga


"A Babilônia caiu de repente e ficou arruinada. Lamentem por ela! Consigam bálsamo para a ferida dela; talvez ela possa ser curada. "Gostaríamos de ter curado Babilônia, mas ela não pode ser curada; deixem-na e vamos cada um para a sua própria terra, pois o julgamento dela chega ao céu, eleva-se tão alto quanto as nuvens." (Jeremias, Cap 51, vers. 8 e 9) 


"Preste atenção, querida
De cada amor, tu herdarás só o cinismo
Quando notares, estás à beira do abismo
Abismo que cavaste com teus pés" (Cartola) 





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