domingo, 2 de setembro de 2012

Sobre um brinde poético a um desencontro.



Eu me arrastava para aquelas "armadilhas" sabendo que estava sendo guiado pelos meus instintos e desejos para lugar algum. Eram desencontros com data, local e hora marcada. Te encontrava sempre calado, dono de muitos silêncios. Eram poucas as palavras entre um baseado e um cigarro seu. Te achava tão lindo, suas formas, sua tatuagem, sorrisos e olhos e mãos e pés e pernas. Eu não te olhava, eu te devorava com os olhos, eu não te assistia, eu te contemplava. 
O mar de Copacabana visto do 20º andar, frases cheias de um conteúdo que eu não conhecia até então. 
E o nosso sexo? Era estranho, parecia que fazíamos um no outro, e não um com o outro, havia eu, havia você, e havia o abismo entre nós. 
É como se seus toques em minha pele fossem dados a um palmo de distância (e mesmo assim me levavam ao êxtase). Tu parecias tão temeroso, assustado, como se eu carregasse nas mãos a possibilidade de algum grande mal, quando mal sabia você, era eu quem estava ali, consciente disso, me entregando para ser imolado.
Rapaz voador que soube, já não voa mais. Tu fizestes de mim um parágrafo, foste pra mim, em três encontros, um capítulo inteiro. 
Aquela noite fora uma das mais místicas que já vivi. Você, medida do meu desejo adormecido sob lençóis rígidos e limpos, também rígido e limpo feito uma montanha de carne e músculos e pele e ossos sobre a cama que era pra ti pouco menos que uma moldura, o morro da Urca na janela, madrugada fria de céu limpo e uma lua cheia riscando o mar que fazia ondas quase tão insistentes e certamente tão insipientes quanto o meu desejo por ti. Lá fora ouvia risadas, buzinas, carros e as ondas, e dentro do meu peito um silêncio ensurdecedor. Eu ficava acordado vigiando teu sono, acariciando o desconhecido que meu desejo tinha elegido, e você dormia longe, muito longe, mesmo quando envolto no meu abraço. Fora a última vez que te vi, já sabia. Quanta riqueza de detalhes pra um detalhe no calendário da minha biografia ainda não terminada.

Mas não quero que entenda assim, então me adianto a dizer-te que você não me arde a memória, não me dói. Lembro de ti feito uma aparição, de quem hoje não tenho nenhum contato (a Vida fez isso sabe lá porque). Guardo nossas conversas, a curiosidade de saber se realizaram-se seus planos, se você superou aquele medo todo que estampava nos seus gestos. Guardo você sabe lá Deus porque, e é sem dor, é com um carinho estranho e mal endereçado. É com um desejo de que estejas bem e feliz. É com uma vontade de que estejas sendo, em algum lugar qualquer.

E tudo isso é porque hoje, passando em frente aquele hotel, senti o frio daquela noite, e o calor daqueles lençóis, e porque estava devendo poesia àquela noite. Senti saudades e resolvi brindá-la, como de costume, poeticamente. 

Phelipe Ribeiro Veiga 
02 de Setembro de 2012 - 18:43



Uma lua no céu apareceu
Cheia e branca; foi quando, emocionada
A mulher a meu lado estremeceu
E se entregou sem que eu dissesse nada.

Larguei-as pela jovem madrugada
Ambas cheias e brancas e sem véu
Perdida uma, a outra abandonada
Uma nua na terra, outra no céu.

Mas não partira delas; a mais louca
Apaixonou-me o pensamento; dei-o
Feliz - eu de amor pouco e vida pouca

Mas que tinha deixado em meu enleio
Um sorriso de carne em sua boca
Uma gota de leite no seu seio.
(Soneto de Despedida - Vinicius de Moraes)







Um comentário:

Beatriz Adrien disse...

Sempre incrível menino do olhar verde gaio

(...)

Eu vi uma casa se despir. Era uma despedida. Se despia dos quadros das paredes e exibia as marcas do tempo como um corpo que, após usar por ...