quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Sobre uma meretriz desesperada.



A Poesia me abordou feito uma meretriz desesperada, com muitas fomes, cheia de urgências, como uma mulher no cio. Ela me cobrou tudo que sou sem me dar chance de dizer não e ofereceu-me em troca uma noite eterna, e orgasmos sem enquanto. Rasgou tudo que me encobria, exigiu de mim a nudez da alma. Fez-me suportar o frio de minha própria existência. Me despiu feito a luz que despe a sombra, rasgou minha primeira e minha segunda  e minha terceira pele, alojou-se no subsolo dos meus sentimentos, erodiu minhas identidades todas. A Poesia me bagunçou inteiro, fez de mim caos, cacos, pedaços de um todo que vou remontando enquanto ela bagunça de novo. A Poesia me mutilou inteiro, roubou meus sentidos, meus membros todos, nem mesmo meu sexo escapou. A Poesia me fez fetiche do meu próprio fetiche. Fez-me voyeur do milagre natural da Vida. Fez da sensação o centro da galáxia, um imenso buraco negro onde não há tempo ou espaço. Pôs o meu amor do avesso. A Poesia usurpou de mim o principado de mim mesmo. Fez-me só olhos, e em cada poro meu ela emula uma diferente expressão. Ela ri e chora em mim e de mim, goza com meu prazer e com meu horror e não hesita em rimar mesmo meu mais tenebroso pavor, sou seu caminho pro tudo e pro nada, e ela é a minha Vida inteira. A Poesia me matou e me fez viver para sempre. Sou a subtração de todas as coisas que eu poderia ter sido, e a soma de tudo que jamais pensei me tornar por causa dela, a Poesia fez isso tudo por puro capricho. A Poesia roubou-me a Vida inteira, me deu a vocação da Morte por afogamento em tudo que a Vida faz sentir e finge ser. Somos!

Phelipe Ribeiro Veiga
26 de Dezembro de 2012 - 22:09

Um comentário:

Luana disse...

Muito diferente dq eu costumo ler. Muuuuuito bom mesmoooooooo...

(...)

Eu vi uma casa se despir. Era uma despedida. Se despia dos quadros das paredes e exibia as marcas do tempo como um corpo que, após usar por ...