terça-feira, 28 de maio de 2013

Sobre migalhas de pão.



E eu vou me esticando e me esticando, e vão se despedaçando as horas e dias e semanas e anos, rubores, palavras, sons, grandes sucessos, saudades, perdas, e eu vou me esticando e me esticando, e vão se despedaçando os amores, os odores, os laços todos, os amigos, os sorrisos, os esforços, os salários, e eu vou me esticando e me esticando e vão se despedaçando os planos, os sonhos, as expectativas, os luares, os olhares, e até os mares e eu vou me esticando e me esticando, e vão se despedaçando os pores de sol, e as estrelas cadente, e os morros e montanhas reluzentes das manhãs de outrora, e os horários dos ônibus todos, e os sinais e semáforos, e as provas da escola, e o pique se esconde, e eu vou me esticando e me esticando e vão se despedaçando meus rabiscos e minha caligrafia, minhas assinaturas e minhas dedicatórias e os desenhos que fiz quando criança e as minhas fotografias, e as digitais que deixei por aí, e as pedrinhas que chutei por todos os caminhos, e eu vou me esticando e me esticando e vão se despedaçando meus nomes, apelidos, impressões e expressões, minha voz, minhas cicatrizes, meus calores, minhas roupas, meus brinquedos, minhas verdades e minhas mentiras e as bandeirinhas de quando menino, e as mágoas todas, e também as alegrias... e eu vou me esticando e me esticando... até que eu me despedace também... as lembranças serão só migalhas de pão que terei deixado no caminho do passado para saber retornar ao lugar onde eu não conhecia ninguém, e de ninguém era conhecido. Um dia não terei sido. E tudo será novo. Enquanto isso eu vou me esticando e me esticando... e vão se despedaçando todas as coisas...

Phelipe Ribeiro Veiga
28 de Maio de 2013 - 23:56

"A Vida é um adeus demorado." (Fernando Pessoa)

Nenhum comentário:

(...)

Eu vi uma casa se despir. Era uma despedida. Se despia dos quadros das paredes e exibia as marcas do tempo como um corpo que, após usar por ...