domingo, 10 de janeiro de 2016

O corpo consome-dor



O corpo de que a gente se serve, que a gente serve pro Outro e a quem a gente serve. Afinal pra que serve o corpo? Dedos paralelos exibem um cigarro se consumindo, mas o que consome o corpo quando consome o cigarro? O que consomem os dedos? Quando jogamos sua cabeça pra trás numa gargalhada, exibindo o pescoço, balançando os cabelos, enrijecendo o peito o que consome o corpo? O que queremos quando despimos o corpo ou quando cobrimos ele? Quando consome um instante? Uma imagem? Um outro corpo? Dá pra consumir um outro corpo? Esse invólucro do que somos, essa casca da fragilidade desconhecida que, dizem, está dentro. Essa prisão perpétua de estar onde estamos desde que nascemos até o momento de partirmos - partirmos? Acaso chegamos? Esse haver-se com o gozo nosso tão incompreensível que a gente tenta pluralizar, se diluir, acrescentar um monte de "a gente"e mais um tanto de "todo mundo" pra se sentir menos só. O corpo é esse visgo que se apegou, onde a alma por vezes habita o pé, outra hora a mão, depois a cabeça e de pois o peito esquerdo, onde a alma se perde lá dentro. Essa confusão é o corpo. Esses sinais ininteligíveis. O corpo que vai escorrendo por entre os dedos da ideia de ser quem somos pra sempre feito um punhado de areia, que vai derretendo, enrugando, ficando cansado, indisposto. O corpo que tanto pede, a quem tanto dissemos não promove sua vingança final. Ele se Es-vai. Ele diz nãos impossíveis de se dissuadir. O que consome o corpo quando se consome? E quando some? Quem consome o corpo? 

Phelipe R. Veiga
10 de janeiro de 2016

"Calcula quanto tempo credor, amante, superior ou cliente, te subtrai e quanto as querelas conjugais, as reprimendas aos escravos, as atarefadas perambulações pela cidade; acrescenta as doenças que nós próprios nos causamos e também todo o tempo perdido: verás que tens menos anos de vida do que contas" (Sêneca 4 a.c. / 65 d.c.)


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